03 agosto 2015

Difusos e Coletivos - Consumidor, fornecedor, produto e serviço


ROTEIRO DE AULA

Profª Erika Bechara

Agosto/2015

 

 

CONSUMIDOR, FORNECEDOR, PRODUTO E SERVIÇO

 

 

1. A PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR NO ÂMBITO INTERNACIONAL

 

Resolução ONU 39/248, de16 de abril de 1985: avanço mais importante sobre a proteção do consumidor no âmbito internacional, cujas normas, porém, não são imperativas, cabendo a cada governo implementá-las de acordo com sua prioridades e necessidades.

 

2. A PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR NA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA

 

- Art. 5º, inc. XXXII da CF/88: “O Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor”

 

- art. 170, inc. V da CF/88: é princípio da ordem econômica a “defesa do consumidor”

 

- Art. 48 das Disposições Constitucionais Transitórias: “O Congresso Nacional, dentro de cento e vinte dias da promulgação da Constituição, elaborará código de defesa do consumidor”

 

3. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR: Lei 8.078/90

 

3.1 A vulnerabilidade do consumidor e o tratamento desigual entre consumidor e fornecedor

 

Art.4º, inc. I do CDC: adota como princípio da Política Nacional das Relações de Consumo o “reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo”

 

- Vulnerabilidade não é situação econômica ou cultural, mas desigualdade. Por essa razão e pelo fato de serem, consumidor e fornecedor, figuras desiguais, o CDC trata-os DESIGUALMENTE. Com isso, respeita o princípio da igualdade (=isonomia), segundo o qual os iguais devem ser tratados igualmente e os desiguais devem ser tratados desigualmente, na medida de suas desigualdades.

 

3.1.1 Vulnerabilidade e hipossuficiência

 

Antonio Herman Benjamin: “A vulnerabilidade é traço universal de todos os consumidores, ricos ou pobres, educados ou ignorantes, crédulos ou espertos. Já a hipossuficiência é marca pessoal, limitada a alguns - até mesmo uma coletividade - mas nunca a todos os consumidores.

(...)

A vulnerabilidade do consumidor justifica a existência do Código. A hipossuficiência, de por seu turno, legitima alguns tratamentos diferenciados no interior do próprio Código, como, por exemplo, a previsão da inversão do ônus da prova (art. 6º, VIII)” (Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1995, p. 243)

 

3.2 Incide apenas sobre a relação de consumo

 

Relação de consumo: envolve, de um lado, o consumidor (ou quem lhe seja equiparado) e de outro o fornecedor, tendo como objeto a aquisição de um produto ou a utilização de um serviço.

 

3.3 A relação de consumo existe apenas quando ocorre circulação de mercadoria:

 

Antonio Herman Benjamin: “...a idéia nuclear da nossa disciplina não é o consumo isoladamente considerado. Consumo que não implique em circulação de produtos e serviços não interessa ao Direito do Consumidor. O agricultor que produz e ao mesmo tempo consome seus produtos não é relevante para o Direito do Consumidor. E não se pode dizer que, in casu, não houve consumo. Faltou, entretanto, a qualidade da circulação, da transferência de bens de consumo” (até porque, se não há transferência, circulação, não haverá duas figuras distintas: consumidor e fornecedor, mas só uma figura: fusão de fornecedor e consumidor na mesma pessoa)

 

4 RELAÇÃO DE CONSUMO

 

4.1 CONSUMIDOR

 

O CDC fornece quatro definições/equiparações de “consumidor”, quais sejam:

 

1ª) Art. 2º, caput: “Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”

 

- define o consumidor PADRÃO ou STANDARD

 

- consumidor é pessoa física e jurídica

 

- 3 CORRENTES para definir o "destinatário final": finalista, maximalista e finalista temperada

 

(i) FINALISTA: consumidor é quem adquire o produto ou serviço para uso próprio e particular e, assim, o retira definitivamente do mercado (bem de consumo). Nesse sentido, não é destinatário final quem adquire o bem ou serviço para fins profissionais (bem de produção) ou como insumo de sua atividade econômica (i.e, o "consumidor intermediário")

 

(i.1) existência de relação de consumo

 

“Bem móvel. Embargos monitórios. Sustação dos cheques sob alegação de defeito no bem adquirido. Alegação de vício e de responsabilidade civil da vendedora. Ausência de reclamação no prazo legal. Código de Defesa do Consumidor. Inaplicabilidade. Em se tratando de consumidor que adquiriu mercadorias para fins econômicos, não se enquadra, assim, como “destinatário final”, não há, in casu, a aplicação da lei consumerista. Compradora não comprovou o fato constitutivo de seu direito, de rigor a improcedência da ação. Apelo improvido (TJSP - 35ª Câm. de Direito Privado; Ap nº 9272539-46.2008.8.26.0000-São Paulo-SP; Rel. Des. José Malerbi; j. 17/1/2011; v.u.).

[...]

Embora inexista impedimento de se reconhecer a condição de consumidor até mesmo à pessoa jurídica, para que isso ocorra, é necessário que o produto ou serviço por ela consumido não constitua componente obrigatório ou necessário da sua atividade fim, isto é, que os bens ou serviços adquiridos pela empresa não sejam insumo da mercadoria fabricada ou comercializada, como ocorre na hipótese dos autos.

A prova documental apresentada com a petição inicial comprova a compra e venda dos bens pela recorrente (fls. 13/24), a qual afirma que sua atividade é voltada para gravações de CDs e DVDs (fls. 87), sendo evidente que o aparelho (gravador) por ela adquirido integra a cadeia produtiva do seu ramo. Além disso, a testemunha por ela arrolada afirmou que o “material adquirido integrava um estúdio que se destinava à gravação de CDs e DVDs para venda” (fls. 76).

Portanto, a apelante não figura como destinatária final. A doutrina não considera consumidora a empresa que adquire bens, produtos ou serviços para utilizá-los como insumos, bens de produção ou como instrumento de trabalho. Por conta disso, a jurisprudência vem-se firmando no sentido de que compete à pessoa jurídica, geralmente empresa que persegue e visa ao lucro, o ônus de provar que adquiriu o produto ou o serviço como destinatário final, por não ser presumida a sua vulnerabilidade. O Código Consumerista regula, efetivamente, situações em que haja destinatário final, que adquire produto ou serviço para uso próprio sem finalidade de produção de outros produtos ou serviços. Assim, não há que se falar em aplicabilidade das normas contidas no Código de Defesa do Consumidor no caso em apreço.

 

(i.2) inexistência de relação de consumo

 

“DIREITO CIVIL - PRODUTOR RURAL DE GRANDE PORTE - COMPRA E VENDA DE INSUMOS AGRÍCOLAS - REVISAO DE CONTRATO - CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - NAO APLICAÇAO - DESTINAÇAO FINAL INEXISTENTE - INVERSAO DO ÔNUS DA PROVA - IMPOSSIBILIDADE - PRECEDENTES -RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO.

I - Tratando-se de grande produtor rural e o contrato referindo-se, na sua origem, à compra de insumos agrícolas, não se aplica o Código de Defesa do Consumidor, pois não se trata de destinatário final, conforme bem estabelece o art.  do CDC, in verbis : "Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final". II - Não havendo relação de consumo, torna-se inaplicável a inversão do ônus da prova prevista no inciso VIII do art. , do CDC, a qual, mesmo nas relações de consumo, não é automática ou compulsória, pois depende de criteriosa análise do julgador a fim de preservar o contraditório e oferecer à parte contrária oportunidade de provar fatos que afastem o alegado contra si.

III - O grande produtor rural é um empresário rural e, quando adquire sementes, insumos ou defensivos agrícolas para o implemento de sua atividade produtiva, não o faz como destinatário final, como acontece nos casos da agricultura de subsistência, em que a relação de consumo e a hipossuficiência ficam bem delineadas. IV - De qualquer forma, embora não seja aplicável o CDC no caso dos autos, nada impede o prosseguimento da ação com vista a se verificar a existência de eventual violação legal, contratual ou injustiça a ser reparada, agora com base na legislação comum.

V - Recurso especial parcialmente provido. (STJ - 3ª T.; REsp nº 914.384 – MT, Rel. Min. Massami Uyeda, j. 02/09/2010)

 

(ii) MAXIMALISTA: consumidor é quem retira definitivamente o produto do mercado ou usa o serviço para si, independemente se o faz para fins particulares ou profissionais. Ex: dentista que compra equipamentos para seu consultório.

 

(iii) FINALISTA TEMPERADA: consumidor é quem adquire o produto ou serviço para uso próprio e particular (e, assim, o retira definitivamente do mercado), ou aquele que o faz para fins profissionais ou com objetivo de lucro, DESDE que, neste caso, ele esteja em condição de vulnerabilidade técnica, jurídica ou econômica, ou que o bem ou serviço adquirido para fins profissionais esteja oferecido no mercado como típico bem de consumo. Ex: taxista que adquire um carro (táxi) para trabalhar ou costureira que compra uma máquina de costura.

 

“AQUISIÇÃO DE VEÍCULO ZERO-QUILÔMETRO PARA UTILIZAÇÃO PROFISSIONAL COMO TÁXI. DEFEITO DO PRODUTO. INÉRCIA NA SOLUÇÃO DO DEFEITO.  AJUIZAMENTO DE AÇÃO CAUTELAR DE BUSCA E APREENSÃO PARA  RETOMADA DO VEÍCULO, MESMODIANTE DOS DEFEITOS. SITUAÇÃO VEXATÓRIA E HUMILHANTE. DEVOLUÇÃO DO VEÍCULO POR ORDEM JUDICIAL COM RECONHECIMENTO DE MÁ-FÉ DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA DA MONTADORA. REPOSIÇÃO DA PEÇA DEFEITUOSA, APÓS DIAGNÓSTICO PELA MONTADORA. LUCROS CESSANTES. IMPOSSIBILIDADEDE UTILIZAÇÃO DO VEÍCULO PARA O DESEMPENHO DA ATIVIDADE PROFISSIONALDE TAXISTA. ACÚMULO DE DÍVIDAS. NEGATIVAÇÃO NO SPC. VALOR DA INDENIZAÇÃO.

1. A aquisição de veículo para utilização como táxi, por si só, não afasta a possibilidade de aplicação das normas protetivas do CDC

2. A constatação de defeito em veículo zero-quilômetro revelahipótese de vício do produto e impõe a responsabilização solidária da concessionária (fornecedor) e do fabricante, conforme preceitua o art. 18, caput, do CDC

3. Indenização por dano moral devida, com redução do valor.

4. Recurso especial parcialmente provido.” (REsp 611872, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, j. 02.10.2012)

 

“Civil - Relação de consumo - Destinatário final. 

A expressão “destinatário final”, de que trata o art. 2º, caput, do Código de Defesa do Consumidor, abrange quem adquire mercadorias para fins não econômicos, e também aqueles que,  destinando-as  a fins econômicos, enfrentam o mercado de consumo em condições de vulnerabilidade; espécie em que caminhoneiro reclama a proteção do Código de Defesa do Consumidor porque o veículo adquirido, utilizado para prestar serviços que lhe possibilitariam sua mantença e a da família, apresentou defeitos de fabricação. Recurso Especial não conhecido. (STJ - 3ª T.; REsp nº 716.877-SP; Rel. Min. Ari Pargendler; j. 22/3/2007; v.u.)

 

2ª) Art. 2º, §único: “Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo”

 

3ª) Art. 17: “Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores todas as vítimas do evento”

 

- trata do consumidor “bystander”, ou seja, daquela pessoa que, mesmo sem ter participado diretamente na relação de consumo, sofre alguma lesão (em sua integridade físico-psíquica, segurança...) decorrente desta relação. É a VÍTIMA DO ACIDENTE DE CONSUMO.

 

- nesta equiparação se incluem os intermediários e quaisquer outros excluídos do art. 2º. Basta, para tanto, que tenham sido VÍTIMAS do acidente de consumo.

 

“ACIDENTE AÉREO - TRANSPORTE DE MALOTES - CONSUMIDOR POR EQUIPARAÇÃO
Código de Defesa do Consumidor - Acidente aéreo - Transporte de malotes - Relação de consumo - Caracterização - Responsabilidade pelo fato do serviço - Vítima do evento - Equiparação a consumidor - Art. 17 do CDC.

1 - Resta caracterizada relação de consumo se a aeronave que caiu sobre a casa das vítimas realizava serviço de transporte de malotes para um destinatário final, ainda que pessoa jurídica, uma vez que o art. 2º do Código de Defesa do Consumidor não faz tal distinção, definindo como consumidor, para os fins protetivos da lei, “ .... toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”. Abrandamento do rigor técnico do critério finalista. 2 - Em decorrência, pela aplicação conjugada com o art. 17 do mesmo diploma legal, cabível, por equiparação, o enquadramento do autor, atingido em terra, no conceito de consumidor. Logo, em tese, admissível a inversão do ônus da prova em seu favor. Recurso Especial provido. (STJ - 3ª T.; REsp nº 540.235-SP (2003/0059595-9); Rel. Min. Castro Filho; j. 7/2/2006; v.u.)

 

4ª) Art. 29: “Para os fins deste Capítulo e do seguinte equiparam-se aos consumidores todas as pessoas determináveis ou não, expostas às práticas nele previstas”

 

Os capítulos a que se refere são: (a) DAS PRÁTICAS COMERCIAIS e (b) DA PROTEÇÃO CONTRATUAL

 

4.2 FORNECEDOR

 

Art. 3º: “Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços”

 

- fornecedor deve exercer a atividade com “habitualidade” e “profissionalidade”

 

4.2.1 Entes despersonalizados

 

- massa falida, heranças jacente e vacante, espólio, e condomínio (clássicas), consórcios de empresas, joint ventures etc.

 

4.2.2 Locador de imóveis

Os contratos de locação não são abrangidos pela disciplina do CDC, particularmente no que se refere à multa por atraso de pagamento de aluguel. Precedentes citados: REsp 38.274-SP, DJ 22/5/1995, e REsp 131.851-SP, DJ 9/2/1998.” (REsp 300.214-MG, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 10/4/2001)

 

4.2.3 Banco

 

- Art. 192 da CF/1988: “O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, em todas as partes que o compõem, abrangendo as cooperativas de crédito, será regulado por leis complementares que disporão, inclusive, sobre a participação do capital estrangeiro nas instituições que o integram.” (EC 40/2003)

 

Com base neste artigo a Confederação Nacional do Sistema Financeiro (Consif) ajuizou, no fim de 2001, uma ação direta de inconstitucionalidade (ADIN 2.591), pedindo imunidade ao CDC. NO entanto, prevaleceu o entendimento de que o CDC não visa à regulação do Sistema Financeiro, mas à proteção e defesa do consumidor, pressuposto de observância obrigatória por todos os operadores do mercado de consumo:

 

“ART. 3º, § 2º, DO CDC. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. ART. 5o, XXXII, DA CB/88. ART. 170, V, DA CB/88. INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. SUJEIÇÃO DELAS AO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE JULGADA IMPROCEDENTE. [redação da ementa dada nos embargos de declaração]

1. As instituições financeiras estão, todas elas, alcançadas pela incidência das normas veiculadas pelo Código de Defesa do Consumidor. 2. "Consumidor", para os efeitos do Código de Defesa do Consumidor, é toda pessoa física ou jurídica que utiliza, como destinatário final, atividade bancária, financeira e de crédito. 3. O preceito veiculado pelo art. 3º, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor deve ser interpretado em coerência com a Constituição, o que importa em que o custo das operações ativas e a remuneração das operações passivas praticadas por instituições financeiras na exploração da intermediação de dinheiro na economia estejam excluídas da sua abrangência. 4. Ao Conselho Monetário Nacional incumbe a fixação, desde a perspectiva macroeconômica, da taxa base de juros praticável no mercado financeiro. 5. O Banco Central do Brasil está vinculado pelo dever-poder de fiscalizar as instituições financeiras, em especial na estipulação contratual das taxas de juros por elas praticadas no desempenho da intermediação de dinheiro na economia. 6. Ação direta julgada improcedente, afastando-se a exegese que submete às normas do Código de Defesa do Consumidor [Lei n. 8.078/90] a definição do custo das operações ativas e da remuneração das operações passivas praticadas por instituições financeiras no desempenho da intermediação de dinheiro na economia, sem prejuízo do controle, pelo Banco Central do Brasil, e do controle e revisão, pelo Poder Judiciário, nos termos do disposto no Código Civil, em cada caso, de eventual abusividade, onerosidade excessiva ou outras distorções na composição contratual da taxa de juros. ART. 192, DA CB/88. NORMA-OBJETIVO. EXIGÊNCIA DE LEI COMPLEMENTAR EXCLUSIVAMENTE PARA A REGULAMENTAÇÃO DO SISTEMA FINANCEIRO. 7. O preceito veiculado pelo art. 192 da Constituição do Brasil consubstancia norma-objetivo que estabelece os fins a serem perseguidos pelo sistema financeiro nacional, a promoção do desenvolvimento equilibrado do País e a realização dos interesses da coletividade. 8. A exigência de lei complementar veiculada pelo art. 192 da Constituição abrange exclusivamente a regulamentação da estrutura do sistema financeiro. CONSELHO MONETÁRIO NACIONAL. ART. 4º, VIII, DA LEI N. 4.595/64. CAPACIDADE NORMATIVA ATINENTE À CONSTITUIÇÃO, FUNCIONAMENTO E FISCALIZAÇÃO DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. ILEGALIDADE DE RESOLUÇÕES QUE EXCEDEM ESSA MATÉRIA. 9. O Conselho Monetário Nacional é titular de capacidade normativa --- a chamada capacidade normativa de conjuntura --- no exercício da qual lhe incumbe regular, além da constituição e fiscalização, o funcionamento das instituições financeiras, isto é, o desempenho de suas atividades no plano do sistema financeiro. 10. Tudo o quanto exceda esse desempenho não pode ser objeto de regulação por ato normativo produzido pelo Conselho Monetário Nacional. 11. A produção de atos normativos pelo Conselho Monetário Nacional, quando não respeitem ao funcionamento das instituições financeiras, é abusiva, consubstanciando afronta à legalidade. (STF, ADIN 2.591, Rel. Min. Eros Grau, j. 07/06/2006) 

 

- Súmula STJ 297 (editada em 2004): O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.

 

- Código de Autorregulação Bancária: aprovado pela Febraban em 2008 e em vigor desde janeiro de 2009 (faz parte do Sistema de Autorregulação Bancária):

 

“Art. 2. As normas da auto-regulação não se sobrepõem, mas se harmonizam à legislação vigente, destacadamente ao Código de Defesa do Consumidor, às leis e normas especificamente direcionadas ao sistema bancário e à execução de atividades delegadas pelo setor público a instituições financeiras. 

 

Art. 3. As normas da auto-regulação abrangem todos os produtos e serviços ofertados ou disponibilizados pelas Signatárias a qualquer pessoa física, cliente ou não cliente (o "consumidor").”

 

4.2.4 Sites de intermediação de vendas

 

“DIREITO DO CONSUMIDOR. RECURSO ESPECIAL. SISTEMA ELETRÔNICO DEMEDIAÇÃO DE NEGÓCIOS. MERCADO LIVRE. OMISSÃO INEXISTENTE. FRAUDE. FALHA DO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO PRESTADOR DO SERVIÇO.

1. Tendo o acórdão recorrido analisado todas as questões necessárias ao deslinde da controvérsia não se configura violação ao art.535, II do CPC.

2. O prestador de serviços responde objetivamente pela falha de segurança do serviço de intermediação de negócios e pagamentos oferecido ao consumidor. 3. O descumprimento, pelo consumidor (pessoa física vendedora do produto), de providência não constante do contrato de adesão, mas mencionada no site, no sentido de conferir a autenticidade de mensagem supostamente gerada pelo sistema eletrônico antes do envio do produto ao comprador, não é suficiente para eximir o prestador do serviço de intermediação da responsabilidade pela segurança do serviço por ele implementado, sob pena de transferência ilegal de um ônus próprio da atividade empresarial explorada.

4. A estipulação pelo fornecedor de cláusula exoneratória ou atenuante de sua responsabilidade é vedada pelo art. 25 do Código de Defesa do Consumidor.

5. Recurso provido. (STJ - REsp: 1107024 DF 2008/0264348-2, Relator: Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, Data de Julgamento: 01/12/2011, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 14/12/2011)

 

“Prestação de serviços. Ação de indenização por danos material e moral. Site de intermediação de negócios por meio eletrônico. Consumidor vítima de estelionato. Aquisição de celular junto à ofertante que promovia a venda ostentando falsa qualificação. Falso cadastro hospedado no domínio da empresa apelante. Aplicação do Código de Defesa do Consumidor (artigo 14). Responsabilidade objetiva do prestador de serviço. Relação jurídica de intermediação que não exonera o intermediador de responder pelos defeitos verificados na segurança das informações disponibilizadas que levaram ao usuário ao prejuízo experimentado. Dano material comprovado. Restituição do valor pago na falsa aquisição. Dano moral comprovado e fixado com moderação, observados os fatos, as condições das partes envolvidas e a repercussão do dano. Desnecessidade de qualquer redução. Correção monetária não se aplica do evento, mas da decisão que o arbitrou. Apelo provido em parte” (Apelação Cível nº 1.224.674-0/5, 32ª Câmara do TJ/SP, Rel. Des. Ruy Coppola j. 21.05.2009).

 

REPARAÇÃO DE DANOS. COMPRA E VENDA DE PRODUTO PELA INTERNET. PROMOÇÃO VEICULADA EM SITE DE COMPRAS COLETIVAS CONHECIDO POR "PEIXE URBANO". PRODUTO PAGO E NÃO ENTREGUE. FRAUDE. DIREITO À RESTITUIÇÃO DO VALOR PAGO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO SITE RESPONSÁVEL PELA INTERMEDIAÇÃO DA COMPRA E QUE AUFERE LUCROS COM O SERVIÇO OFERTADO. PRELIMINAR AFASTADA.

1. A parte recorrente, que administra a empresa de compras coletivas, obtém lucro significativo com o serviço que disponibiliza e a partir daí deve responder por eventuais prejuízos decorrentes de fraudes que seu sistema de segurança não consiga impedir. Veja-se que a responsável direta pelo ilícito somente chegou até a autora graças ao serviço disponibilizado pelo demandado, o qual tinha tal loja em seus cadastros. Em outras palavras, o responsável pela conduta criminosa atingiu a autora graças ao serviço de ofertas organizado e disponibilizado pela demandada aos consumidores cadastrados, lucrando, assim, valores significativos, e até por isso deve responder quando o sistema mostra-se falho, responsabilidade esta que pode ser afastada quando demonstrada absoluta falta de cautela por parte do usuário, o que não foi o caso. 2. Danos morais configurados. Inexecução contratual que ultrapassa o limite do razoável no caso concreto, submetido a autora a considerável frustração, tendo que se valer da via judicial para assegurar direito manifesto. Caráter punitivo e pedagógico da medida. Quantum adequado (R$ 2.000,00). SENTENÇA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. RECURSO IMPROVIDO. (TJ/RS, Recurso Cível Nº 71004459376, Terceira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Carlos Eduardo Richinitti, Julgado em 24/10/2013)

 

4.2.5 Entidades sem fins lucrativos

 

4.2.6 Advogados

 

- Favorável à aplicação do CDC aos advogados:

 

“Prestação de serviços advocatícios. Código de Defesa do Consumidor. Aplicabilidade.

I - Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos serviços prestados por profissionais liberais, com as ressalvas nele contidas.

II - Caracterizada a sucumbência recíproca devem ser os ônus distribuídos conforme determina o art. 21 do CPC.

III - Recursos especiais não conhecidos.” (STJ, RECURSO ESPECIAL Nº 364.168 – SE, Rel. Min. ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO, j. 20.04.2044)

 

“APELAÇÃO CÍVEL. MANDATO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ADVOGADO NÃO EVIDÊNCIADA.

Trata-se de ação indenizatória, onde a parte autora objetiva a indenização por danos materiais e morais decorrentes do procedimento profissional inadequado da parte ré nos autos da ação trabalhista.

A responsabilidade civil do advogado está disciplinada no artigo 32 do Estatuto da Advocacia. Aplicável ao caso também, a regra contida no § 4º do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor;

Com efeito, a responsabilidade civil do advogado é subjetiva e, em sendo assim, deve ser examinada mediante a verificação de culpa, ex vi legis do artigo 667do Código Civil Brasileiro.

No caso dos autos, não obstante a lamentável conduta da advogada em não comparecer em audiência marcada, ficou evidente que não foi o não comparecimento da advogada, ora ré, na audiência trabalhista, que repercutiu no resultado desfavorável daquela ação, conforme quer fazer entender a autora, mas sim a pena de confissão aplicada a própria apelante e o panorama probatório acarreado naqueles autos.

Manutenção da r. sentença que julgou improcedente a ação, por considerar que não há, no caso, indenização de natureza material ou moral a ser reconhecida.

APELAÇÃO DESPROVIDA. (TJ-RS, 15ª Cam Civ, Apelação Cível 70034862433, Rel. Des. NIWTON CARPES DA SILVA, j. 06.07.2011)

 

- Desfavorável à aplicação do CDC aos advogados:

 

“RECURSO ESPECIAL. SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS. CONTRATO. NAO INCIDÊNCIA DO CDC. DEFICIÊNCIA NA PRESTAÇAO DOS SERVIÇOS. NEGATIVA DE QUEFORA EFETIVAMENTE CONTRATADO PELO CLIENTE. DANOS MORAIS. CARACTERIZAÇAO. SÚMULA 7/STJ. PRESCRIÇAO. NAO OCORRÊNCIA. RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO.

1.- As relações contratuais entre clientes e advogados são regidas pelo Estatuto da OAB, aprovado pela Lei n. 8.906/94, a elas não se aplicando o Código de Defesa do Consumidor. Precedentes.

2.- A convicção a que chegou o Tribunal de origem quanto ao nexo de causalidade entre a conduta do advogado que negou que fora contratado e recebera procuração do cliente para a propositura de ação de cobrança e os danos morais suportados por esse decorreu da análise do conjunto fático-probatório, e o acolhimento da pretensão recursal demandaria o reexame do mencionado suporte, obstando a admissibilidade do especial à luz da Súmula 7 desta Corte.

3.- Sendo a ação de indenização fundada no direito comum, regular a aplicação do art. 177 do Código Civil, incidindo a prescrição vintenária, pois o dano moral, na presente hipótese, tem caráter de indenização, de reparação de danos e pela regra de transição (art. 2.028 do Novo Código Civil) há de ser aplicado o novo prazo de prescrição, previsto no art. 206, 3º, IV do mesmo diploma legal.

4.- Recurso Especial improvido.” (STJ-3ªT), Recurso Especial nº 1.228.104 – PR, Rel. Min. SIDNEI BENETI, j. 15.03.2012)

 

PROCESSUAL - AÇÃO DE ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS - PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS - CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - NÃO APLICAÇÃO - CLÁUSULA ABUSIVA - PACTA SUNT SERVANDA.

Não incide o CDC nos contratos de prestação de serviços advocatícios. Portanto, não se pode considerar, simplesmente, abusiva a cláusula contratual que prevê honorários advocatícios em percentual superior ao usual. Prevalece a regra do ‘pacta sunt servanda’. (REsp 757867/RS, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/09/2006, DJ 09/10/2006)

 

4.2.7 Rodovias como prestadoras de serviços

 

“Concessionária de rodovia. Acidente com veículo em razão de animal morto na pista. Relação de consumo.

1.           As concessionárias de serviços rodoviários, nas suas relações com os usuários da estrada, estão subordinadas ao Código de Defesa do Consumidor, pela própria natureza do serviço. No caso, a concessão é, exatamente, para que seja a concessionária responsável pela manutenção da rodovia, assim, por exemplo, manter a pista sem a presença de animais mortos na estrada, zelando, portanto, para que
os usuários trafeguem em tranqüilidade e segurança. Entre o usuário da rodovia e a concessionária, há mesmo uma relação de consumo, com o que é de ser aplicado o art. 101, do Código de Defesa do Consumidor.

2.           Recurso especial não conhecido.” (STJ, REsp 467883, Min. Rel. Menezes Direito, j. 17/06/2003)

 

4.3 PRODUTO

 

Art. 3º, §1º: “Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial”

 

- todos os bens que tenham um valor econômico

 

4.4 SERVIÇO

 

Art. 3º, §2º: “Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista”

 

4.4.1 Serviços “mediante remuneração” e serviços “hipoteticamente gratuitos”, cuja remuneração, na verdade, está embutida no preço

 

- estacionamento gratuito

 

Súmula 130 do STJ: “A empresa responde, perante o cliente, pela reparação do dano ou furto de veículo ocorridos em seu estacionamento”

 

RESPONSABILIDADE CIVIL. HOTEL. ROUBO NO ESTACIONAMENTO. DEVER DE VIGILÂNCIA E GUARDA. EXCLUDENTE DE FORÇA MAIOR NÃO CARACTERIZADA. EMPRESA QUE NÃO TOMA PRECAUÇÕES MÍNIMAS TENDENTES A EVITAR OCORRÊNCIAS DE TAL NATUREZA. FALTA AO DEVER DE VIGILÂNCIA E GUARDA. RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO.

[...]

O hotel mantém, anexo ao edifício principal, o estacionamento com a finalidade de atrair a clientela, propiciando-lhe não só maior conforto, como também e sobretudo segurança. Cria-se, assim, um vínculo entre o estabelecimento comercial e o hóspede: enquanto este confia em que o seu carro se encontra devidamente protegido, o dono da instituição comercial, a seu turno, aufere maiores lucros em razão da prometida segurança. Essa a diretriz de há muito prevalecente nesta Corte: "a empresa que explora hotel é responsável pela indenização de furto de automóvel, verificado em estacionamento que mantém, ainda que não cobre por esse serviço destinado a atrair clientela, por falta ao seu dever de vigilância" (REsp n° 6.069-SP, Relator Ministro Eduardo Ribeiro, in "Lex - Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e dos Tribunais Regionais Federais", vol. 29, pág. 168).

No caso, não se caracteriza a alegada excludente de responsabilidade, ainda que se trate de roubo. É que, na situação em exame, a ora recorrente não cuidou de tomar precauções mínimas para evitar ocorrências de tal monta e natureza. O Acórdão, confirmando a base fática descrita, pôs em destaque a fragilidade da segurança na garagem do hotel. São palavras textuais do voto condutor do v. Acórdão: "tendo o manobrista que se dirigir até ela sozinho, descer do veículo para abrir o portão, trancado com um cadeado, em local perigoso na cidade, denota insuficiência de vigilância por parte do estabelecimento.

Providências outras deveriam ter sido tomadas pelo apelante no sentido de evitar o que acabou acontecendo, fato presumível diante das circunstâncias. A presença de um segurança armado, que abrisse e fechasse rapidamente o portão dando cobertura ao manobrista, dificultaria a atuação dos marginais". (STJ, RESP 227.014/GO, Rel. Min. Barros Monteiro, j. 16/10/2001)

 

“RESPONSABILIDADE CIVIL. RECURSO ESPECIAL. TENTATIVA DE ROUBO EM

CANCELA DE ESTACIONAMENTO DE SHOPPING CENTER. OBRIGAÇÃO DE

INDENIZAR.

1. A empresa que fornece estacionamento aos veículos de seus clientes responde objetivamente pelos furtos, roubos e latrocínios ocorridos no seu interior, uma vez que, em troca dos benefícios financeiros indiretos decorrentes desse acréscimo de conforto aos consumidores, o estabelecimento assume o dever - implícito em qualquer relação contratual - de lealdade e segurança, como aplicação concreta do princípio da confiança. Inteligência da Súmula 130 do STJ.

2. Sob a ótica do Código de Defesa do Consumidor, não se vislumbra a possibilidade de se emprestar à referida Súmula uma interpretação restritiva, fechando-se os olhos à situação dos autos, em que configurada efetivamente a falha do serviço - quer pela ausência de provas quanto à segurança do estacionamento, quer pela ocorrência do evento na cancela do estacionamento, que se situa ainda dentro das instalações do shopping.

3. É que, no caso em julgamento, o Tribunal a quo asseverou a completa falta de provas tendentes a demonstrar a permanência na cena do segurança do shopping; a inviabilidade de se levar em conta prova formada unilateralmente pela ré - que, somente após intimada, apresentou os vídeos do evento, os quais ainda foram inúteis em virtude de defeito; bem como enfatizou ser o local em que se encontra a cancela para saída do estacionamento uma área de alto risco de roubos e furtos, cuja segurança sempre se mostrou insuficiente.

4. Outrossim, o leitor ótico situado na saída do estacionamento encontra-se ainda dentro da área do shopping center, sendo certo que tais cancelas - com controles eletrônicos que comprovam a entrada do veículo, o seu tempo de permanência e o pagamento do preço - são ali instaladas no exclusivo interesse da administradora do

estacionamento com o escopo precípuo de evitar o inadimplemento pelo usuário do serviço.

5. É relevante notar que esse controle eletrônico exige que o consumidor pare o carro, insira o tíquete no leitor ótico e aguarde a subida da cancela, para que, só então, saia efetivamente da área de proteção, o que, por óbvio, o torna mais vulnerável à atuação de criminosos, exatamente o que ocorreu no caso em julgamento.

6. Recurso especial a que se nega provimento.” (STJ – 4ª T, REsp 1269691/PB, Rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO,  j. 21/11/2013)

 

- programa de milhagem de companhias aéreas

Entendendo que a concessão de passagens com milhas é uma gratuidade:

 

“CONSUMIDOR. TRANSPORTE AÉREO. PROGRAMA DE MILHAGEM "SMILES". TENTATIVAS INEXITOSAS DE TROCA DOS PONTOS ACUMULADOS POR PASSAGEM AÉREA. AUSÊNCIA DE ATO ILÍCITO IMPUTÁVEL Á RÉ. PREVISÃO CONTRATUAL EXPRESSA DE QUE O RESGATE ESTÁ CONDICIONADO À DISPONIBILIDADE DOS ASSENTOS DESTINADOS AOS USUÁRIOS DA PROMOÇÃO. RECUSA QUE CONFIGURA EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO. INVIABILIDADE DE RESSARCIMENTO DAS PASSAGENS ADQUIRIDAS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS.

Durante o mês de abril de 2011, o autor buscou resgatar os pontos acumulados no programa de milhagem SMILES, objetivando a troca por passagens aéreas com destino aos EUA. Sua tentativa, contudo, restou frustrada, sendo informado da indisponibilidade de assentos vagos nos meses pretendidos. Acabou, então, por adquirir diretamente com a companhia aérea as passagens. Assim, postula o ressarcimento do valor desembolsado. Como bem observou o juízo de origem, as regras do programa promocional estão expressamente previstas em seu regulamento, havendo menção clara à possibilidade de limitação dos assentos disponibilizados a seus usuários. O autor certamente aderiu ao programa ciente de seu funcionamento. Aliás, é de conhecimento público que os programas de milhagem possuem milhões de usuários, os quais, naturalmente, disputam entre si os assentos vagos. Justamente em razão dessa circunstância, o gozo dos benefícios previstos no programas exige, salvo exceções, planejamento com antecedência e certa flexibilidade do usuário, notadamente quando o objetivo, como no caso concreto, é o transporte aéreo internacional, muito visado. Logo, embora inequívoca a frustração do autor, a situação vivenciada é corriqueira e não se reveste de qualquer ilicitude. A gratuidade dos benefícios oferecidos confere legitimidade à recusa de reserva em determinados vôos, possuindo a companhia ré direito e responsabilidade exclusiva de administrar seus trechos. Aliás, exigir a livre disponibilização de assentos gratuitos sequer se mostra razoável, pois, logicamente, representaria prejuízo ao equilíbrio financeiro da companhia. Demonstrada, assim, a ausência de ato ilícito e presumível a ciência do autor acerca do regulamento do programa a que aderiu, é inviável a pretensão de ressarcimento do valor desembolsado na aquisição de passagens. Sentença de improcedência mantida por seus próprios fundamentos, nos termos do art. 46da Lei n. 9.099/95. RECURSO DESPROVIDO. (Recurso Cível Nº 71004183026, Segunda Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Alexandre de Souza Costa Pacheco, Julgado em 07/08/2013)